É natural no mercado de trabalho que, de tempos em tempos, ocorra um processo de renovação. A nova geração que surge traz sempre profissionais mais bem preparados e com mais conhecimentos técnicos e interpessoais.
Isso posto, iniciamos uma série de entrevistas com novos talentos da Sommellerie (traduzido seria algo como Sommelieria em Português), profissionais jovens, que têm investido em formação profissional séria, buscando certificações internacionais que servem de alicerces para o profundo conhecimento do mundo do vinho.
Nossa 1ª entrevista será com o Sommelier de um famoso e já tradicional Bar de Vinhos (Bar a Vin) da noite Paulistana, o BARDEGA. Pelo cargo de Head Sommelier, passaram profissionais de altíssimo gabarito, como Aldo Assada e Gabriel Raele, sendo agora a vez do nosso entrevistado: Luís Otávio Álvares Cruz.
A conversa se passou nas dependências do BARDEGA, durante um dia de semana, e Luís que está sempre muito atarefado, encontrou um tempo para nos atender e prestigiar. Boa leitura!!
Luís, qual sua origem? Quantos anos tem, de onde vem e qual sua formação educacional?
Sou de São Paulo, tenho 31 anos e me formei em jornalismo, mas atuei pouco na área, o mundo do vinho me atraiu rápido e sem perceber, já estava trabalhando em salão.
E no Mundo Do Vinho? Quais os cursos que realizou e que certificações possui hoje?
Fiz o curso profissional de três módulos da ABS em São Paulo e depois a homologação de Sommelier Profissional da ABS Brasil, que é uma prova de degustação e serviço nos moldes dos campeonatos da ASI. Quem passa ganha o pin verde e amarelo numerado, o meu é o número 33. A última certificação que fiz foi o Frech Wine Scholar da WSG, uma certificação em vinhos franceses.
Como foi que começou a atração pelo vinho e pela carreira de Sommelier?
Eu tinha me formado em jornalismo e fui morar em Santos com minha companheira. Quando fui procurar emprego lá nas redações, percebi que era um mercado pequeno e não tinha muito espaço para um recém-formado. Através da minha companheira, conheci um jornalista de Santos que trabalhou muitos anos no Estadão e naquela época tinha um bistrô na cidade chamado Petit Verdot. Fui lá como cliente e batemos um papo sobre jornalismo e pedi para que ele me ajudasse na área. A filha dele, que era amiga de infância da minha companheira, propôs para que eu trabalhasse lá no bistrô por um tempo, para ele me conhecer melhor e eu topei. Era um bistrô com uma carta grande de vinhos, tínhamos quase 500 rótulos disponíveis e foi lá meu primeiro contato com o vinho. Aprendi muita coisa lá, a degustar e entender a diversidade de estilos, uvas, regiões e também a fazer o serviço do vinho. Conversava com o cliente na mesa e tentava entender o que ele queria e levava três opções de vinho para ele escolher e eu ia explicando cada um deles. Sem perceber já estava fazendo o serviço de sommelier e vi que, além de gostar daquilo, eu tinha certa facilidade. Dai resolvi fazer o curso da ABS para me aprimorar e às segundas, na minha folga, eu vinha para São Paulo estudar.
Como você vê a profissão hoje, quais os desafios, as dificuldades e as coisas boas de ser um Sommelier de uma casa tão respeitada e frequentada pelos enófilos de todo o Brasil?
Vejo a profissão com muitas chances de crescer ainda, o lado difícil é que sabemos que no Brasil, nessa área de restaurante, tanto no salão quanto na cozinha, a remuneração ainda não chegou no patamar que esses profissionais realmente merecem.
Ser sommelier aqui no Bardega foi muito importante porque além de ser uma referência em Wine Bar, atendo pessoas do Brasil inteiro, então meu trabalho começou a ser visto. A parte difícil é conseguir dar atenção para todos os clientes, ainda mais em finais de semana quando recebemos cerca de 200 pessoas por noite.
Você nos apresentou alguns vinhos muito diferentes que fazem parte da sua carta no Bardega. Vinhos como o Orange de Noirs e o Metamorphika, ambos da Costador, são verdadeiros achados. Como você consegue encontrar esses vinhos tão distintos e o que o atrai nesses vinhos de estilo mais orgânico e/ou natural?
Gosto sempre de ter vinhos de estilos diferenciados na carta. Parece que 96 vinhos em taça são muita coisa, mas preciso ter uma seleção que mostre toda a diversidade de países, uvas e estilos, e acho importante colocar vinhos fora da curva também. O Costador, por exemplo, hoje é um dos projetos mais interessantes da Catalunya, vinhedos velhos de uvas autóctones, vinificação ancestral em ânforas, além de ter manejo biodinâmico no vinhedo. O vinho tem muita personalidade e não é o quê as pessoas estão habituadas a beber. Quando eu apresento um vinho desse para um consumidor que só bebe Malbec Argentino, eu estou abrindo a mente dele para novas experiências e gostos, que ele nunca tinha sentido e se ele não gostar, tudo bem, foi apenas uma dose! O que vale é sair da zona de conforto e arriscar para conhecer coisas novas.
O Bardega parece estar de volta aos bons tempos, em que a casa ficava frequentemente lotada. A que você atribui esse reaquecimento do seu público, mesmo com um câmbio ainda desfavorável às importações?
Acredito que o publico do vinho vem aumentando a cada ano. Temos várias importadoras no mercado trazendo coisas interessantes como nunca antes e os jovens também querem entender mais sobre vinho.
Você foi um dos finalistas do Programa Ambassador da Wines of Chile e esteve com um grupo de colegas visitando o Chile e algumas das vinícolas mais expressivas de lá. Qual foi sua impressão da viagem e como você vê o atual momento da indústria vitivinícola Chilena?
Foi muito bom conhecer as vinícolas e projetos de perto, conversar com os enólogos, entender melhor o terroir de cada região. O que mais me impressionou foi a diversidade de estilos que um país como Chile tem e é isso que eles querem mostrar para o mercado. Uma mesma cepa pode fazer vinhos bem diferentes em algumas zonas, seja pelo solo, clima, e até mesmo pelas técnicas de alguns enólogos. Degustamos, por exemplo, Carménère de Apalta colhido um mês antes do que o usual e vimos que produziu um vinho com um caráter totalmente diferente do que estamos acostumados, sem o lado verde da cepa e com o frescor da fruta. Me impressionou o trabalho sendo feito em regiões extremas, como o projeto Lago Ranco da Casa Silva na região Austral do Chile. O resgate das vinhas velhas no Maule também acho fundamental.
Você foi Vice-campeão Brasileiro de Sommeliers pela ABS do Brasil no ano de 2019, um campeonato duríssimo e disputou contra outras feras mais experientes do mundo do vinho. Quais seus planos daqui por diante? Para a sua carreira de uma forma geral.
Fiquei muito feliz com o Vice-campeonato. Na verdade fiz a prova como um treino e acabei indo para a final e ficando em segundo lugar, atrás do Tiago Locatelli, que é uma referencia para mim. Foi a primeira vez que fiz a prova e ter ido tão bem, sabendo de tanta gente qualificada que estava ali prestando junto comigo, deu-me confiança para continuar fazendo os concursos. Pretendo também fazer outras certificações e fui convidado pela ABS para lecionar nos módulos de serviço à partir de 2020, o que me deixou muito contente ao saber que uma instituição com 30 anos de experiência acredita no meu trabalho.
Que conselhos você daria para quem está começando na Sommellerie e quais as perspectivas que você vislumbra para esse mercado profissional?
Meu conselho para quem quer ser sommelier é que você precisa ser humilde, pois conhecer sobre vinhos não o torna melhor do que ninguém. Precisa se colocar no lugar do outro: “como eu gostaria de ser atendido?”. Tem que gostar de trabalhar com o público, por mais difícil que seja o seu dia. Nunca parar de estudar, ser honesto, ter muita paciência, disciplina e respeitar sua equipe. Acho que essas são algumas ferramentas para se tornar um bom profissional.
Durante a conversa, Luís as vezes se ausenta para atender seus clientes, sempre com muita presteza, simpatia e atenção, procurando entender o gosto do cliente e passando informações simples e claras sobre suas recomendações. Como se não bastasse, suporta toda a equipe de Sommeliers e Garçons do bar, com direcionamentos claros e objetivos, inclusive garantindo que não haja garrafas vazias nas Enomatics e que não sejam apresentados vinhos com defeitos.
Luís é seguramente um dos novos talentos dessa profissão e ainda iremos ouvir muito sobre suas realizações e progresso na carreira.
Até a próxima entrevista (links abaixo) …
Nova Geração de Sommeliers – Marina Bufarah de Souza
Nova Geração de Sommeliers – Robson Dos Santos Venâncio
Entrevista muito legal. Jovem e competente, gostei de ter enfatizado a humildade como princípio fundamental. Parabéns! Abraço.
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Dri, o Luís Otávio é, sem dúvida alguma, um jovem e promissor talento, que respeita a profissão e as pessoas. Abraço, Dri!
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Ainda não conheço esse bar, fiquei muito interessado com essa matéria. Parabéns!!
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Alan, esse talvez seja o Wine Bar mais famoso de SP. Vale muito conhecer o bar e toda a equipe do Luís. Grande abraço.
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Importantíssima profissão. A harmonização é o elemento que permite que comida e vinho possam oferecer o que têm de melhor.
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Comendador, esse moço é um dos que têm elevado, em muito, a qualidade do serviço de vinho no Brasil. Tenho certeza que ainda irá disputar muitos campeonatos e concursos e vai se sair magistralmente. Abraço.
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Belissima entrevista e trabalho da página !! Parabéns !!!
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Fernando, esse menino vai longe ainda. Um talento prodigioso. Abraço, meu caro!
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Grande Luis !! Além de conhecer muito de vinhos, é um excelente DJ de música brasileira !! Velhos tempos de Petit Verdot e Corisco !!
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