A Caçada

Por Fernando Procópio:

Somos todos amantes de vinhos. Isso é claro. Nossos hábitos de consumo são pesquisados, assim como os de apreciadores de muitos outros produtos. E a verdade é que eles (os pesquisadores) fornecem as informações para que o pessoal de marketing lance as iscas para nos cativar, para nos fisgar.

Você certamente já buscou um vinho na Internet. O que acontece em seguida? Em todos os sites que você abra, aparecerá o vinho ou opções semelhantes de importadoras ou de adegas. Na maioria das vezes, vocês está em um site que não tem nada a ver com vinhos. Mas, ah!, eles estão lá, por vezes até atrapalhando a sua leitura ou sua visão. Você acessa e, de repente, aparece aquele vinho que você ama. Como pode?

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Não importa! Nem todos entendemos de tecnologia. O que importa é que esses vinhos nos perseguem. Mas, não vamos dar bola para eles, não é mesmo? Que ilusão! Bem ali na tela, um dos favoritos ou aquele que um amigo havia comentado no dia anterior. Você clica porque está em promoção.

A verdade, é que somos caçadores modernos. Ao invés de corrermos atrás de javalis, veados e outros animais, estamos atrás de vinhos. Já prometeu a si mesmo que nos próximos dois meses não faria nenhuma compra? A promessa durou até aparecer bem ali aquele lá que você há tanto tempo queria.

Quando comecei a curtir vinhos com mais atenção, disse à minha filha que iria comprar uma adega para umas dez, doze garrafas. Ela, que é do ramo, me alertou: “Pai, melhor comprar uma maior, pelo menos para 30 a 40. Logo vai perceber que ficou pequena”. E não é que ela tinha toda a razão? A de 50 serviu por um tempo. Mas, continuavam a aparecer ofertas daqueles rótulos tão desejados e… eu comprava. Resolvi partir para uma bem maior. Então, tive que enfrentar uma negociação com a minha mulher: “não dá para colocarmos uma “geladeira” como essa na sala”. Esteticamente não ficaria bem mesmo. Até que achei uma com acabamento em madeira, até bonitona, que não destoaria do mobiliário. Vitória! Encomendei.

Passaram 30, 40, 50 dias e chegou! Estou no escritório e me liga o zelador do prédio: “Doutor, vai ter que subir pela janela. Há empresas especializadas, essas que basculam pianos”. Felizmente, porém, estávamos pintando o apartamento e o dito zelador – um santo! – resolveu pesquisar melhor e concluiu que a adega cabia no elevador social e, tirando a porta de entrada, ela passaria e estaria bem onde deveria estar: na sala. Graças à cabeça do zelador e à força dos pintores.

Bom, então termina aí a novela, com desfecho feliz. Não é bem assim, porque as ofertas não pararam de aparecer. Você olha aquele anúncio, consulta um site do exterior e – olhe só! – está quase o preço lá de fora. Ou pode ser a safra, aquela que o amigo cujas opiniões você respeita muito lhe disse que é inigualável. Ah, mas tem também o Robert Parker ou a Decanter martelando a pontuação na sua cabeça: 97 pontos nesse preço? E aí, os vinhos que vão chegando não cabem mais nem em uma adega, nem em outra. A pequena ficou para os vinhos de giro rápido. A grande para os mais nobres.

Descobri então que a biblioteca é um ótimo lugar para guardar também vinhos. Ambiente austero, fechado, sem receber luz solar e, sobretudo, bem fresco.

Deveria estar contente, então. Por uns bons tempos sim. Só que a minha adega virtual (no Vivino) continuava crescendo. O que fazer? Onde arrumar espaço? Vasculhando o apartamento, constatei que um dos quartos deixados pelas filhas ainda era um quarto e, portanto, tinha cama. E debaixo da cama, um belíssimo local para guardar garrafas. Bom, a fase seguinte foi o nosso quarto, o do casal.

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Costumo dizer que estamos criando vinhos inteligentes, que são os que se acomodaram na biblioteca, e os preguiçosos, que se refestelam embaixo da cama.

Mas fica a dica de que há adegas que, além de venderem vinhos, permitem que você armazene os seus ali. Por algum tempo, mas nenhuma tem reclamado que preciso sacá-los de lá.

Já há cerca de dois anos o nível não ultrapassou mais o que consegui colocar como limite, mas devo confessar que às vezes sofro para não comprar. Essa pandemia atrapalhou bastante esse processo pois não há mais almoços, jantares ou festas – principalmente as de família – em que eu conseguia levar todos os vinhos que iriam ser servidos: do espumante, passando pelos brancos, os tintos e os de sobremesa. Quem voltem logo esses tempos!

Muitas vezes fico imaginando que prazer tão grande quanto provar é o de conseguir arrematar um dos vários vinhos que estão na minha wishlist. Mas, não estou sozinho. Frequento alguns grupos de WhatsApp e Facebook em que a atitude me parece exatamente a mesma. E você, como se comporta? Conte-nos aqui nos comentários do Post!

Fernando Procópio
Apreciador de Vinhos

47 comentários em “A Caçada

  1. Belíssimo artigo amigo Procópio!
    Não está fácil em tempos de confinamento controlar os dedos nervosos no teclado e consequentemente nas compras.
    Nem me fale a imensa saudade e desejo de poder voltar os tempos de degustações presenciais e encontros com amigos e familiares, saboreando toda a diversidade de sabores vínicos! 🍷🍷🍷
    Parabéns Grande Comendador! 👏🏻👏🏻👏🏻
    Grato pela partilha!!! 🙏🏻🙏🏻🙏🏻

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    1. Gostei da categorização de guarda dos vinhos. E os preguiçosos então …
      Também sempre digo que não compro mais…e para evitar o impulso, ultimamente prefiro nem pesquisar.
      Fiquei a imaginar a cena para encaixar a preciosa adega no elevador. Rsrs!

      Parabéns pela matéria e tema querido Confrade.
      Ansioso para que voltemos logo a baixar nossos estoques nas Confrarias presenciais.

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      1. Nilton, nem preciso comentar sobre a sua adega. E o que é mais engraçado é que, quando estava abarrotada dos tintos, você descobriu os brancos e espumantes. kkkkk. Abração e obrigado!

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      2. Muito bom Fernando estou há anos tentando convencer minha mulher a liberar um pedaço da casa pra fazer uma adega climatizada daquelas com ar condicionado. Uns 20 m2. Mas até agora sem sucesso.
        Grande abraço

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    2. Amigo Kerjean, muito difíceis esses tempos de isolamento. Não sinto o mesmo prazer de abrir uma garrafa, mesmo nos encontros virtuais. Quero compartilhar meus melhores rótulos com os amigos.

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  2. Comendador Procópio, parece que você copiou minha história kkkkk, quando mudei de casa resolvi fazer uma adega grande (pelo menos eu achava) acho que ainda suporta uns dois anos.
    Mas brincadeira à parte, essa é a história de muitos de nós.
    Parabéns pelo texto.
    Ao Sitta parabéns pelos 3 anos do blog.
    Grande abraço!!!

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    1. Amigo Helcio, tenho que lhe confessar que sinto uma inveja irrefreável de V. Exa. Sua adega não só é suficientemente grande, como maravilhosa. Um dia,terei uma assim. Abração e obrigado pelo comentário.

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    2. Tem vaga na família? Somos uma turma animada que bebe bem. Podemos ajudar a resolver esse seu problema de estoque excessivo. Sabemos apreciar e agradecer. Tudo nariz de perdigueiro. Sabemos o valor de um bom vinho. Pode ser latino, anglosaxonico, gales, romanico, ibérico ou seja qual for a origem. Pode ter Passagem por madeira ou ser frutado, chocar no ovo De cimento ou em enterrado em anfora de adobe. Quanto as uvas? sem preconceito, mais importante o carinho dedicado que a nobreza de estirpe.

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    1. Perfeito, Comendador! Me vi em cada linha desse divertido texto! Da mesma forma precisei negociar com a esposa pra comprar uma bela adega duas portas da “Metier” (desculpe o merchand, Sitta kkK), que pensei jamais conseguiria encher… ledo engano! E hoje me vejo preocupado em como fazer para “repatriar” quase duas centenas de vinhos “escondidos” em lojas, na empresa, casa de amigos, portaria do prédio e adega virtual da VD… e o que me preocupa é o medo de acontecer um imprevisto na vida e esses vinhos ficarem perdidos por aí… Pelo menos consegui que um amigo catalogasse todos eles e se comprometesse a avisar a esposa caso algo dê errado… se ele não fizer isso volto pra beber com ele!!! 😂

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      1. Rapazzz! Que coincidência! A minha maior também é da Metier. E, sim, vamos fazer merchand: muito boa (já tem cerca de 7 anos comigo e sem problemas), bonita (minha mulher gostou) e muito barata se comparada a outras.Essa do catálogo é sensacional, Ackurihara!

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    2. Obrigado, Mazon. Vamos tentar pensar nesse virus como um “investimento”. O problema é que a gente vai tomando o “investimento” aos poucos. hehehe; Abração

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  3. Procópio, a tua narrativa reflete a história de muitos de nós. Eu mesma me identifiquei 100%, da quebra de promessas a achar lugar para mais uma garrafa.
    Mas isto nos faz feliz. E vamos vivendo. Grande abraço.

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  4. Ótimo texto, Procópio!
    Compartilho do mesmo drama. Com o tempo aprendi a não acreditar quando alguém disser que “esta adega é muito grande”, pois não existe adega grande demais…

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    1. Concordo, José Eduardo. Já não encontro mais espaço por aqui. Nunca pensei que teria tantos vinhos. Meu zelador – aquele santo – quando fica na portaria sempre arruma uma forma de brincar com a chegada de mais um reforço. hehehe

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  5. Que lindo texto amigo Procópio! Pareceu ter sido escrito para mim que vivo quebrando seguidas promessas de ficar um tempo sem comprar vinhos! Falar nisso: acabei de fazer uma comprinha!! Kkkkkk Grande abraço amigo!

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    1. kkkkk. Irresistíveis, não, Toni? O meu consolo é que Maria Amelia tem também um desejo quase irrefreável por bolsas, sapatos e outras cositas más. Ontem, apareceu um “quarda-roupa” de uma loja feminina aqui em casa. hehehe

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  6. Muito bom, Procópio. Lembro quando comentei com você, num evento, do meu problema com a insuficiência das minhas duas adeguinhas de 40 garrafas cada. Quando falei, muito sem jeito, por onde estava espalhando garrafas, você riu e me contou a sua história. Fiquei feliz em ver que você já tinha doutorado no assunto que – com muito humor e categoria – você confessa aos quatro ventos. Em tese eu conquistei um alvará para um dia, se e quando as coisas permitirem, aumentar meu potencial para umas 200 garrafas. Por enquanto armários e gavetas continuam a oferecer seus préstimos. Grande abraço!

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  7. Caraca Fernando. Que post bacana… impressionante como nossos hábitos são semelhantes. Compulsão? Imagina, isso é coisa de mulher… hahaha

    Parabéns amigo e conte sempre com os amigos para ajudar a desocupar os espaços.

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    1. Darlington, essa é a parte triste da quarentena: um dos maiores prazeres que temos é o de compartilhar bons vinhos com os amigos. Nesse clima, não podemos. Nos encontros virtuais, não sinto vontade de abrir os vinhos melhores. Quero poder compartilhá-los com os amigos.

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    1. Kkkkk. Não se iluda, Adriana. Tem uns amigos – não vou dizer quais são – com adegas de mais de 2 mil garrafas. Cheguei a cogitar de construir uma. Não aqui em casa, em um lugar estratégico, mas desisti.

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  8. Kkkk, muito bom. Belo texto!? Um dilema entre todos os amantes do vinho. Parabéns!

    Lendo o titulo do texto me veio uma ideia de tema que gostaria de sugerir, Sitta: o trabalho de “caçar” cada uma das garrafas da vertical com todas as safras de don Melchor organizada pelo Daniel Dalzochio. Acredito que algumas safras devem ter se escondido bem! Kkk
    Abraços

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  9. Confesso que cheguei no limite da adega, mas o consumo aumento então quando vejo que espaço para mais uns 3 vinhos já volto a comprar…tão bom quanto beber é comprar vinho. Ótima matéria

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  10. Fernando uma otima refelxão, no meu caso não consigo suportar uma promoção,e como vinho não estraga (muitp dificil) sempre cabe mais uns.
    Minha cama Bau serve justamente para os preguiçosos rs….. e aja vinho preguiçoso em baixo dela !!
    Parabens Otimo texto !!!

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  11. Excelente texto! Reflete exatamente o meu atual momento… sem mais cantinhos para guardar minhas preciosas garrafas!😬 Estou na busca pela minha terceira adega e estou muito interessada na linha Premium da MÉTIER com capacidade para 200 garrafas.
    Você está satisfeito com a sua adega?
    Consegue armazenar bem as garrafas de vinhos argentinos e chilenos?
    Obrigada!

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  12. Belíssimo texto Comendador. Me enxerguei atrás de suas palavras. Também estou sendo atacado por esse impulso pelas compras e consumindo mais que o normal. Tenho 3 adegas em casa e garrafas espalhadas pela casa. Minha mulher quer me matar … ahahahah. abração !!!

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  13. Qdo não cabe mais em casa guardo no closet da garagem. Para esconder do marido e ir levando aos poucos pra casa, guardo no armário do escritório, mas cabem poucos vinhos, uns 6 só, então pedi o armário do colega de trabalho que não usa o dele e guardo lá também. Já trabalhei num escritório que eu guardava na saída de incêndio, ninguém ia lá mesmo… de acordo com a necessidade vou adaptando! kkkkkkk Abs!

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