Conhece os vinhos das Ilhas das Canárias ?

Por Renato Nahas

“Las Islas Canarias” é um arquipélago localizado no oceano Atlântico e que faz parte do território Espanhol. Tenerife é a capital e cidade mais conhecida. A região é um destino turístico famoso, afinal abriga paisagens naturais únicas, além de um clima subtropical que serve de refúgio aos habitantes do hemisfério norte ao longo do ano.

Fonte: https://pxhere.com/pt/photo/1273846

A região possui um longo histórico de produção de vinhos. A partiu do século XV serviu de entreposto logístico para as embarcações que buscavam rotas para o oriente através do Atlântico.

Atualmente possui uma interessante produção de vinhos, majoritariamente consumidos localmente e pelos turistas. Apesar de pouco conhecido fora de lá, inclusive na Espanha continental, os vinhos locais vêm despertando atenção da crítica, de sommeliers e de enófilos.

Uma breve história

Quando os Europeus começaram a navegar nas costas africanas, no século XV, depararam-se com o arquipélago na costa do Marrocos. A cerca de mil quilômetros da Espanha estava “Las Islas Canarias”.  Em 1479, Portugal e Castilla assinaram o Tratado de Alcáçovas que deu o controle da região para a Espanha (Portugal ficou o Açores, Madeiras e Cabo Verde).

Os espanhóis, então, introduziram o cultivo de uvas. Aproveitando a posição estratégica, rapidamente a região se tornou um grande exportador a partir do século XVI. “Malmsey”, um vinho doce, branco e não fortificado, rapidamente tornou-se popular na Inglaterra, chegando até a receber uma citação na obra de William Sheakspeare, que disse que o vinho “cheers the senses and perfumes the blood”.

É curioso que o termo “Malmsey” se refere a forma que os ingleses pronunciam o nome da uva utilizada na elaboração do vinho, Malvasia. Esse vinho é ainda hoje produzido, em pequena escala.

O terroir das ilhas das Canárias

O clima é subtropical e muitos dizem ser “o melhor clima do mundo”, com temperaturas médias de 22°C no inverno e 28°C no verão. Fica fácil entender a atratividade do turismo. Chove 350-500 mm por ano. Por fim, uma série de correntes marítimas regulam o clima da região. Com isso tudo, as condições são muito adequadas à viticultura.

A região foi criada em decorrência de erupções vulcânicas que influenciaram a topografia, marcada por altitude e terrenos acidentados.

O solo é o grande diferencial da ilha. Nas regiões intermediárias, com altitude ao redor de 800 m encontra-se um solo de origem vulcânica único, o Lapilli (também conhecido como Picón). Esse solo filtra a água da chuva e armazena nutrientes, protegendo-os dos intensos ventos. Também ajuda a diminuir a evaporação da água.

Fonte: Wine Scholar Guild

Uvas da Região

A filoxera nunca alcançou a área. Las Islas Canarias abrigam algumas das vinhas mais antigas da Espanha e do mundo. A produção de brancos é ligeiramente superior à de tintos.

Dentre as uvas brancas, três se destacam:

Malvasía Aromática: originada da Grécia/Cyprus é utilizada na produção do histórico vinho “Malmsey”.

Malvasía Volcánica: também conhecida como Malvasía de Lanzarote é a grande estrela das brancas. Cruzamento natural entre a Malvasía Aromática e a autóctone da área, Marmajuelo. Expressa-se particularmente bem no solo local e produze vinhos famosos pela mineralidade e frescor.

Listán Blanco: que é sinônimo da Palomino, utilizada em Jerez. Adapta-se particularmente bem nas condições de  pouca chuva e abundância de sol

Com relação às tintas, a Listán Negro, também conhecida como Almuñeco reina. Autóctone da região, é utilizada na elaboração de vários estilos, incluindo o elaborado a base de maceração carbônica. Os melhores vinhos são leve, frutados, frescos e com baixos taninos.

As principais Apelações de Origem

Há 11 Denominações de Origem na região. Dentre elas, 4 se destacam:

Fonte: Wine Scholar Guild

DO Lanzarote – criada em 1993, produz majoritariamente brancos (80%), com a uva Malvasía Volcánica que deve compor pelo menos 75% do blend. Os vinhos são minerais, cítricos, frescos e ideias para harmonizar com a gastronomia local.

DO Ycoden-Daute-Isora – criada em 1996, os brancos representam 78% da produção. Vinhedos são cultivados nos terraços do Monte Teide, cuja elevação alcança 1.400 metros.  Os vinhos brancos costumam ser “easy-drinking”, cítricos, frescos e marcados pela mineralidade.

DO Valle de la Orotava – Criada em 1996, é a maior e mais antiga DO das Ilhas Canárias. Brancos representam 60% da produção. É lá que se localiza o Puerto de la Orotava (hoje chamado de Puerto de la Cruz) que era o ponto de conexão com o mundo exterior. Listán Negro é a uva tinta que domina a região. Há, porém, uma tendência de produtores menores produzirem vinhos interessantes a partir de uvas como a Vijariego Negro e a  Tintilla. No campo dos brancos, destaque para os vinhos produzidos a partir da Marmajuelo e Vijariego Blanco.

DO Tacoronte-Acentejo – criada em 1992. Localizada no nordeste de Tenerife, diferencia-se por produzir majoritariamente tintos (83%). A maioria é elaborada exclusivamente com a uva Listán Negro. A maceração carbônica é utilizada no processo de produção, o que resulta em vinhos leves, frescos, taninos macios e com notas de frutas vermelhas frescas, ervas.

Principais produtores das Ilhas Canárias

DO Lanzarote (https://dolanzarote.com): El Grifo, Los Bermejos e Rubicó

DO Tacoronte-Acentejo (http://www.tacovin.com): Carbajales, Cráter e Domínguez Cuarta Generción

DO Valle de la Orotava (https://www.dovalleorotava.com ): La Araucaria, Suertes del Marqués e Tajinaste

DO Ycoden-Daute-Isora (http://ycoden.com) : Borja Pérez, Viñatigo e Envínate

Num mundo em que as denominações de regiões mais badaladas atingem preços estratosféricos, que tal explorar algumas menos conhecidas e que podem entregar boas surpresas. Quando tiver oportunidade, não deixe de provar os vinhos das “Las Islas Canarias”.

Renato Nahas é Sommelier formado pela ABS-SP e Professor nos cursos de Introdução ao Mundo de Vinho e Formação de Sommelier Profissional na ABS-Campinas. Obteve a Certificação Master Level em Borgonha, pela WSG, além da  FWS, IWS, SWS, CSW e WSET3. Além disso é Formador Homologado de Jerez.

2 comentários em “Conhece os vinhos das Ilhas das Canárias ?

    1. Marceu, provei sim e a primeira vez foi marcante. No início de 2019 eu visitava a Espanha, estava em Sevilla e fui num restaurante chamado ABANTAL, que tem uma estrela Michelin, para um jantar harmonizado. 9 etapas, com 9 vinhos diferentes. Para um prato composto por posta de bacalhau fresco, com espuma de tomate, pimentões e alho, foi servido um vinho da DOC Valle de la Orotava, que destaquei no texto acima. Imediatamente fui pesquisar e descobri que era um vinho de 9 Euros, o que me deixou desapontado, pois pelo nível do restaurante, esperava algo “de mais prestígio”, afinal, indevidamente estava associando preço com qualidade. Porém ao provar, me encantei. Na época eu fiz um post mostrando o rótulo e o prato no meu instagram (@nahasvinhos). Reproduzo aqui: “aromas de azeitona, toques salgados, gasolina e abacaxi maduro. Acidez média, encorpado e sabor intenso.
      Disso tudo fica a lição de que um bom Sommelier, como foi caso do desse restaurante é capaz de ousar e fugir do lugar comum. Palmas para ele, a quem agradeço imensamente pelo aprendizado.
      Desde então eu procuro incansavelmente os vinhos da região. Afinal, beber bem, e sem gastar fortuna, é um negócio que eu curto muito.
      Abração

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