Roteiro Priorat: Bodega Mas Alta

Amigos,

Nossa segunda visita no Priorat foi na Bodega Mas Alta, que fica localizada próxima ao povoado de La Vilella Alta, que tem cerca de 150 habitantes.

“When is the last time anyone found a Priorat rated over 90 points for under $25 a bottle? A project of acclaimed Rhône Valley winemakers Phillippe Cambie and Michel Tardieu from one of Priorat’s nine villages, La Vilella Alta.” – ROBERT PARKER

Uma breve introdução

No nosso primeiro post cujo link está a seguir, falamos um pouco sobre a DOQ Priorat (Roteiro Priorat: Mas Martinet). Nessa segunda parte vamos discutir o tema da falta de água na região.

A escassez de chuvas tem sido talvez o maior desafio para os produtores de vinho da região. Por todas as bodegas onde visitamos esse foi um tema recorrente, mas na Bodega Mas Alta, localizada em Vilella Alta, uma das regiões mais afetas pela seca, foi onde falamos ainda mais sobre o assunto.

Hoje, a vinícola possui um sistema de busca de água por satélite, que permite um mínimo de irrigação nos vinhedos. Esse desafio é tão grande que eles possuem um vinhedo apelidado de “Inferno” porque nos três primeiros anos as uvas morreram pela falta de água e pelo calor, até que mudaram a maneira de plantio que permitiu que as raízes conseguissem alguma água do solo.

Viver sem que saia uma gota de água potável da torneira. Água em garrafa ou jarra para beber, para cozinhar e até para lavar a louça. O cenário mais temido da pior seca que afetou a Catalunha em um século tornou-se realidade em duas localidades de Priorat, com 200 habitantes cada: Vilella Baixa e Bisbal de Falset. O pesadelo começou no final de agosto. As suas fontes e poços estão quase secos devido à falta de chuva e o reservatório de Margalef (Priorat), que tinha água potável garantida desde a sua inauguração (1994), está tão baixo que o seu fraco caudal não é potável.

As mudanças climáticas fizeram com que as colheitas, que ocorriam no início de setembro e iam até o final de outubro fossem antecipadas para a metade de agosto. Mas o maior impacto é que ela passa a ocorrer em apenas um mês, fazendo com que a bodega tenha que manejar o dobro da quantidade de uva neste período.

No final de janeiro, o Governo da Generalitat decretou emergência de seca na Catalunha, devido a uma situação nunca antes vista na comunidade e que implicou severas restrições. Em termos de dados, o pântano Siurana (Priorat) estava com 3,34% da sua capacidade e o Riudecanyes (Baix Camp) com 2,88%.

Roteiro Priorat: Mas Martinet.

A vinícola

No Priorat você pode encontrar famílias locais que cuidaram de seus vinhedos por gerações, bem como os recém-chegados atraídos pelas possibilidades deste terroir. Mesmo os membros fundadores do Priorat moderno inclui representantes de ambos os campos.

Os fundadores da Bodega Mas Alta, em 1999, Michel e Christine Vanhoutte, são originários da Bélgica, e apaixonados pelos primeiros vinhos que provaram do Priorat, decidiram se mudar para a pequena aldeia de La Vilella Alta com o objetivo de estabelecer uma vinícola própria. No processo eles contaram com a ajuda de Michel Tardieu e Philippe Cambie para iniciar sua bodega. Para administrar a propriedade contrataram Bixente Oçafrain, natural do País Basco, na França, e sua esposa Diane que foi criada no Languedoc.

Bixente estudou agricultura e viticultura em Bordéus antes de se formar em enologia em Montpellier, onde ele conheceu Diane que estudava enologia, biologia e estudos ambientais. Enquanto trabalhava em Bordéus, Bixente conheceu Michel Tardieu que mencionou seu projeto no Priorat. Sua experiência combinada, temperamento e treinamento fizeram deles o casal perfeito para administrar a Mas Alta e eles mudaram-se para o Priorat em 2010.

Quando Diana e Bixente chegaram ao Priorat, começaram a fazer a transição da vinha para agricultura orgânica e implementaram muitas práticas biodinâmicas. Como eles se adaptaram ao terroir da região, também começaram a implementar algumas alterações na vinificação da propriedade. 

Hoje, já houve uma transição na direção enológica da vinícola. O diretor técnico e enólogo é Damia Del Castillo e o chefe de campo é Josep Pujol. Desde a sua criação, Mas Alta tem defendido um estilo de vinho luxuoso e expressivo, mas sob a gestão de Josep e Damia tem havido uma evolução considerável no campo e na adega. Mais cachos inteiros são usados nas fermentações, leveduras indígenas são empregadas e uma preferência pelo envelhecimento em concreto, foudres  e barricas de carvalho maiores e inertes em relação à madeira nova e às pequenas barricas.

Mas Alta tem atualmente 72 ha de vinhas plantadas em 97 parcelas distintas, com área adicional contratada de produtores locais. As principais uvas plantadas, como com a maioria das propriedades no Priorat, são Garnacha de vinhas velhas e Carignan com até 100 anos de idade. Eles também plantam alguns novos vinhedos de Syrah, Cabernet
Sauvignon, Garnacha Negra, além de um quantidade crescente de variedades brancas indígenas como Garnacha Blanca, Pedro Ximénez e Macabeu.

A bodega produz cerca de 150.000 garrafas por ano, sendo com esse volume uma das maiores do Priorat. Cerca de 55% dos vinhos são para exportação em mais de 28 países. Os outros 45% são para consumo na própria Espanha. O portfólio da vinícola conta com 12 vinhos, sendo 4 brancos, o que é muito raro para a região de massiva produção de vinhos tintos.

Visita e Degustação

Durante nossa visita fomos acompanhados pelo diretor comercial da Mas Alta, Manel Subirà, que iniciou nossa visita com um tour por alguns dos vinhedos da bodega que estão situados entre 200 e 656 metros de altitude. Todo o preparo da terra e a colheita é feito com o auxílio de mulas, devido à geografia do terreno. Manel nos contou que as mulas trabalham em duplas e se uma delas ou seu condutor está doente, a outra se recusa a trabalhar. Elas só trabalham em duplas.

A visita pelos vinhedos foi uma aula de como é difícil produzir vinhos por lá. Somente com muito esmero chega-se ao resultado que eles vem obtendo.

Na chegada a bodega, uma rápida visita pelas instalações e a degustação. Provamos 14 rótulos em meio a uma conversa sobre técnicas de produção e estilos de vinhos. A Mas Alta é uma das poucas vinícolas que também tem foco nos brancos, em uma região onde a produção é de mais de 95% de tintos. Iniciamos a degustação com os 4 brancos da vinícola, sendo os dois últimos de alta gama.

Els Pics Blanc 2022: corte de 80% Garnacha Blanca e 20% Macabeo, envelhecimento de 6 meses em contato com a borras em tanques de aço inox e um segundo estágio em cimento. Aromas de frutas cítricas, com notas de especiarias, e algumas notas herbáceas. Em boca tem boa acidez e final frutado. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 315.

Artigas Blanc 2021: corte de 70% Garnacha Blanca, 20% Macabeo e 10% Pedro Ximenez, com estágio de 10 meses em tanques de aço inox e 2 meses em ovos de cimento. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 450.

Partida La Galera 2018: corte de 50% Garnacha Blanca e 50% Chenin Blanc, fermentação em barricas de carvalho francês, estágio de 6 a 8 meses em barricas novas de carvalho francês de 225 e 500 litros e 4 meses em foudres com as borras. Entre ótimos brancos que provamos, na minha opinião este foi o melhor com corpo médio, ótimo equilíbrio, boa acidez e final persistente.

La Solana Alta 2021: corte de 100% de Garnacha Blanca com estágio de 6 meses em barricas novas de carvalho francês, com a borras e 4 meses em foudres. Vinho complexo, com boa acidez, notas cítricas combinadas com frutas brancas e final persistente. 

Els Pics 2021: corte de 50% Garnacha, 40% Carignan, 5% Merlot e 5% Syrah. Estágio de 10 meses 50% em tanques de cimentos e 50% em barricas de carvalho francês (entre 2 e 5 anos), e após o corte mais 4 meses de estágio em tanques de concreto. Muito interessante como vinho de entrada da vinícola, já em um patamar elevado. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 292.

Artigas 2021: corte de 80% Garnacha, 10% Carignan 10% Cabernet Sauvignon. Estágio de 16 meses em barricas de carvalho francês entre 1 e 3 anos e posterior ao corte estágio durante 4 meses em depósitos de cimento. Vinho frutado, bom equilíbrio, boa tipicidade e final médio. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 420.

Cirerets 2021: corte de 60% Garnacha e 40% Carignan, com estágio de 16 meses em barricas novas de carvalho francês e 6 meses em tanques de cimento. Combina potência e elegância, taninos firmes, acidez média, notas de cereja, volume em boca e final equilibrado. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 580.

La Creu Alta 2019: uvas 100% Carignan de vinhas velhas, estágio de 18 meses em barricas de carvalho francês (80% novas e 20% de segundo uso) e 12 meses em foudres. Vermelho rubi, corpo médio, taninos macios, frutas negras e vermelhas no nariz e na boca, especiarias e final firme e frutado. Vendido na Grapy Garrafeira por R$ 1.600.

L’Exclosa 2021: vinho exclusivo com produção limitada de 602 garrafas e 12 Magnum. Uvas 100% Sirene (Syrah), estágio em barricas de carvalho de 225 litros por 16 meses e 4 a 6 meses em ânforas de 400 litros. A título de curiosidade, Serine é um clone primitivo de Syrah, do norte do Ródano, onde foi praticamente esquecido devido à sua falta de produtividade. Foi plantado em um vinhedo recuperado e que estava abandonado porque não era muito produtivo e se acrescentarmos que esta casta dá rendimentos muito baixos torna-o bastante único, a média é de 800 kg por hectare. Mas, devido à sua mistura inusitada, não pode entrar na nova classificação do DOQ, nem como Paraje nem como Vila, apenas como Priorat D.O.Q genérico.

La Basseta 2020: uvas 100% Garnacha, com estágio de 16 meses em barricas de carvalho francês de primeiro e segundo uso e seguinte estágio de 12 meses sendo 50% em tanques de concreto e 50% em foudre. Bastante equilibrado mas precisa de alguns anos em garrafa, principalmente quando comparado com as safras mais antigas que provamos na sequência.

La Basseta 2014: mesma ficha técnica da safra 2020 mas em um momento excepcional para abrir. Foi o meu favorito na degustação combinando aromas secundários e alguns terciários, muita fruta madura no palato e incrível complexidade. Final largo e persistente.

La Basseta 2011: tão bom quanto a safra 2014, levemente mais ácido, com muita fruta negra em evidência no nariz e na boca. Vale ressaltar que as safras 2004 e 2006 deste vinho receberam 96 pontos de Robert Parker. Uma garrafa veio na mala. Pra abrir em breve.

Fica registrado nosso agradecimento ao Manel e toda a equipe da Bodega Mas Plana. Uma referência na produção de vinhos da região.

Serviço:
Bodega Mas Alta
Importador no Brasil: Grapy Garrafeira
Instagram: https://www.instagram.com/_masalta/
Visitas de segunda a sexta das 9:30 as 17:30 horas

2 comentários em “Roteiro Priorat: Bodega Mas Alta

Deixe um comentário