Quantos anos devemos guardar um vinho? Uma pequena lição que aprendi.

Seu Sitta 1

Amigos,
Há poucos dias, meu pai, o famoso Seu Sitta para os conhecidos, faleceu aos 79 anos. Ainda no momento agudo de saudade resolvi escrever um texto, para abordar uma última lição que aprendi sobre o melhor momento para abrir os melhores vinhos da adega.

Confesso que tenho uma enorme preocupação com o tema e sempre busquei o momento ótimo do vinho para abrir uma determinada garrafa, ou seja, o dia em que a chamada curva de evolução chega no auge, inclusive correndo o risco de perder esse melhor momento. Muitas vezes me vejo comprando vinhos para abrir no mesmo dia, só para não ter que mexer na adega. Na verdade, eu sempre imaginei ter o tempo que fosse necessário para guardar e abrir meus melhores vinhos no momento certo.

Já meu pai era completamente diferente. Bastava ter vontade, que em uma simples segunda-feira de chuva ele abria os melhores vinhos da adega e, via de regra, vinhos bastante novos e muito longe do ponto máximo de evolução. E isso me deixava doido, aliás parecia que ele fazia de propósito. Quantas vezes ele, sabendo que eu passaria em sua casa, não ia na adega e abria um desses, como se fosse uma provocação. Eu dizia que ele adorava “queimar a largada”.

Há cerca de 2 anos ele abriu um Nicolas Catena Zapata 2010, que era o seu vinho favorito. Era a safra que estava saindo da vinícola. Perguntei a ele qual era a vontade dele em sempre experimentar a coisa pela metade, não aguardar o processo completo. A resposta foi serena e firme: “Não vou guardar nada, não sei quanto tempo vou viver. E se quiser, senta aqui e beba comigo”.

E hoje tenho que admitir: pai, mais uma vez VOCÊ ESTAVA CERTO! Hoje tenho vinhos especiais na minha adega que guardei para abrir com ele em alguns anos (especialmente os Cabernet Sauvignon que eram sua paixão, entre eles um Terrunyo 2008 que obviamente já poderia ter sido aberto há tempos) e outros na adega dele que infelizmente ele me deu ouvidos e resolver guardar para a “data especial”. Com certeza vou abri-los mas o prazer não será completo, e dessa vez, com os vinhos possivelmente no auge. Ironicamente verdadeiro.

Então amigos, sem dúvida que guardar vinhos é especial, mas o dia certo para abrir esses vinhos é na visita de uma pessoa especial, é no dia de comemorar as conquistas, é no dia de buscar um apoio, é no dia que sentir que é o dia, independente do estágio de evolução do vinho. O vinho é uma coisa viva, que se completa pelo momento. A ocasião torna o vinho mais ou menos prazeroso. Uma boa companhia vale mais que 10 anos em garrafa.

Ainda assim aproveitei muito os últimos dois anos com seu Sitta. O fato de trabalharmos juntos nesse período nos fez recuperar muito do tempo que ele não teve na hora de estruturar o patrimônio familiar. Fica minha homenagem e a lembrança dessa última lição.

E um último pedido aos amigos. Seu Sitta era uma pessoa alegre e de bem com a vida assim como espero os eventuais comentários nesse Post.

86 comentários em “Quantos anos devemos guardar um vinho? Uma pequena lição que aprendi.

  1. Um brinde ao meu tio querido é um ótimo amigo, companheiro, conselheiro algumas vezes nos encobria em outras nos dava bronca, mas estava sempre conosco.
    Tio vou sentir muito a falta de tomar uns vinhos com você. Te amo.

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  2. Sinto muitíssimo por sua perda. Reconhecer as lições que a vida nos impõe é ter humildade, é desejar aprender continuamente, é não desistir da jornada. Sempre torço para que tenhamos sensibilidade o suficiente para absorver o aprendizado. Saúde, meu amigo!

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  3. Belíssimo texto! Belíssimas palavras! Eu tenho muito mais do Sitta pai do que do Sitta filho. Abro o vinho que quero beber, curto cada gole e se a companhia for boa, abro outra garrafa! Um brinde ao Seu Sitta!

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      1. Grande e verdadeiro depoimento Rodrigo Sitta. Também penso da mesma forma.
        No ano passado perdi a minha mãe que eu gostava de homenagear com um vinho.
        Eu me emocionei profundamente a ler teu post.
        Também está de acordo com minha chamada do Vivino: “Vinho é para ser compartilhado”

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  4. Caro Amigo, o seu Sitta, claro, estava certo pois tinha a sabedoria que vem com o tempo. Mas também esteja certo, que ele, Seu Sitta, estará ao teu lado no dia em que abrir esse Cabernet Sauvignon, e certamente será o dia da perfeita evolução desse vinho…

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  5. Como você mesmo diz, o vinho começa muito antes e acaba muito depois do momento que é bebido. Juntando essa frase com a mensagem desse post, fica reforçado o recado de que a hora certa de beber o vinho não é definido pelo calendário e sim pela companhia.
    Um brinde ao Seu Sitta!

    Grande abraço,

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  6. Lindo post e homenagem! Eu sempre fui fã do Seu Sitta e dos vinhaços que ele abria durante a semana (lembro de varias dessas postagens suas no Vivino), porque penso exatamente como ele. A vida é um sopro, e se a gente ficar só guardando nossos melhores vinhos para o “auge”, pode ser que não tenhamos tempo de desfruta-lo. Com certeza o Seu Sitta aproveitou bastante a vida e os bons vinhos que pode! Adorei seu post! 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼

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  7. Lindo post e homenagem! Eu sempre fui fã do Seu Sitta e dos vinhaços que ele abria durante a semana (lembro de varias dessas postagens suas no Vivino), porque penso exatamente como ele. A vida é um sopro, e se a gente ficar só guardando nossos melhores vinhos para o “auge”, pode ser que não tenhamos tempo de desfruta-lo. Com certeza o Seu Sitta aproveitou bastante a vida e os bons vinhos que pode! Adorei seu post! 👏🏼👏🏼👏🏼

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  8. Registro emocionante, amigo! Grande sabedoria do seu pai que soube te transmitir muito.
    Nosso estado de espírito e a companhia fazem os vinhos melhores que o tempo. Claro que se a gente souber e puder guardar alguns, melhor.
    Mas aproveitar o momento, deixar a vida fluir (ou a vida me levar, no melhor espírito Zeca Pagodinho…) também tem muito valor. Assim se vive!
    Às vezes discuto com minha mulher por bobagens, que me parece muito racional certas vezes; entretanto, sem emoção não se vive. Saber equilibrável-las é uma arte. Embora sem conhecer, acho que teu pai sabia. Em suma, na vida é isto que a gente busca, esse equilíbrio, sabedoria e paz de espírito. Sigamos tentando e bebendo os vinhos que a vida nos proporciona.
    Siga teus sentimentos e um brinde ao pai, que no céu te abençoa.
    Um abraço, meu amigo

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  9. Que lindo texto Sitta, lembro de vc contar essas histórias do seu pai na confraria, tenho certeza que quando vc abriu o Vista Alba 2014 hoje, seu pai deu uma bela e longa gargalhada!! Agora o cajado está em suas mãos, bora ensinar seus meninos o que vc aprendeu com seu pai!! Saúde sempre meu amigo!!

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  10. Um texto emocionante, qual o melhor momento de abri? O melhor momento do vinho ou o Melhor monto da Vida?
    Se pudéssemos unir os dois seria fantástico.

    Só quem tem muita experiência, consegue abrir e mão de uma futura evolução,(nos vinhos) e simplesmente viver o momento com prazer, por melhor que posso ser o amanhã.
    Fica uma reflexão…
    Meus sentimos Sitta !!!
    Forte abraço !

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  11. Belas e sinceras palavras. Seu Sitta devia ser uma excelente pessoa. Gostei muito dessa frase…”Uma boa companhia vale mais que 10 anos de garrafa”.
    Saúde!!!

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  12. Cara, tenho 53 anos e, desses, uns 40 de vinho, desde que comecei uma pequena adega, nunca consegui mantê-la cheia, aliás, todo santo ano tenho que fazer a reposição, não me arrependo. Curta cada dia como se fosse o último. Abraço pra ti, guri!

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  13. Sitta, raras vezes tive oportunidade de ler um texto tão carregado de emoção, não uma emoção ruim, mas aquela emoção genuina, verdadeira, onde realmente o coração se expressa….nós quando jovens não possuimos a experiência dos nossos pais, e não conseguimos compreender naquele momento suas lições, essa foi apenas uma das muitas que ele te passou…que vc continue transmitindo esses ensinamentos aos seus meninos, perpetuando a memória do Seu Sitta! Não há muito mais a escrever, apenas reter na memória seu belo e tocante texto! À vida!

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  14. Caríssimo RODRIGO, tive o prazer e a felidade imensa de ter convivido com o Grande SITTA. amigo igual tive poucos,estar acompanhado do seu pai era um prazer dos maiores.
    Tivemos oprtunidade de viajar por muitos lugares e de tomar vinhos formidáveis e sempre com o mesmo conselho,Marconi vamos tomar agora pois nosso tempo é este..
    Infelizmente o tempo e a distancia nos ssparou e não pude continuar desfrutando de sua presença.
    Hoje depois de ler o seu depoimento ,uma justissima homenagem ao inesquecível SITTA,sinto também que a distancia não permitiu que pudesse usufrir de sua companhia RODRIGO.
    GRANDE ABRAÇO.
    MSITTAl

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    1. Olá Marconi.
      Quanto tempo passou meu caro. As recordações sobre os bons anos de Linhas Corrente ainda são muito presentes. Agradeço muito por sua bela mensagem e quem sabe em breve não nos encontramos para colocar a conversa em dia.
      Em nome de meu pai retribuo os elogios e os laços de forte amizade,

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      1. Caro Rodrigo,espero fortemente um dia te encontrar para conhecê-lo ,agora como adulto, mas também para botar a conversa em dia e relembrar-mos os bons momentos que SITTA nos propiciou,com sua sabedoria e amizade.

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  15. Fantástico Sitta. Ainda não conhecia seu blog e ao ler um comentário seu no Vivino vim conhecer. Esse texto em especial não tem como não comentar, além da emoção ele exprime uma sabedoria que só vem com o tempo. Confesso que me fez pensar diferente, e sem dúvida, você eternizou o Seu Sitta.

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  16. Belíssimo texto Rodrigo! E de grande repercussão entre teus leitores! Meu pai, já falecido, também foi meu parceiro na degustação de vinhos. Não tinha muito conhecimento , mas degustava com prazer, até alguns vinhos meio duvidosos, hahaha! Depois eu passei a fornecer vinhos de boa qualidade para ele degustar! Ficava encantado! Ele também não era de guardar vinhos! Devemos viver a vida e curtir os prazeres que ela nos proporciona! O vinho é um deles! Abraço!

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  17. Embora só o conheça virtualmente, já me considero seu amigo, Sitta! Agradeço pela indicação desse artigo, pelo conselho de vida nele contido e pela amabilidade em compartilhá-lo com aqueles que precisam aprender a valorizar o tempo, a entender a finitude e efemeridade da vida. Lições e exemplos não nos faltam, e seu pai te proporcionou muitas delas.
    Agora é nossa hora de aprender e de ensinar aos que vem atrás de nós, nessa estrada chamada vida! Um grande e fraterno abraço a você e a seu pai, onde quer que ele esteja te assistindo orgulhoso!!!

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  18. Belo Texto Rodrigãoo !!! Tenho acompanhado desde 2018 seu Trabalho, e confesso que tem enriquecido muito o conteúdo sobre Vinhos em minha Vida. Grande Abraço do Amigo aqui de Curitiba … João Queiroz

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  19. Realmente uma lição de vida que deve ser seguido! Parabéns Sitta pelo compartilhamento dessa emocionante postagem!
    Meu pai também é falecido e ao ler esse artigo me lembrou muito dele que fez votos de não beber álcool e permaneceu assim por 40 anos mas e eu queria muito dividir um vinho com meu velho. Eu tentei convencer ele por diversas vezes mas ele era um homem de palava e não queria quebrar seus votos. Até que um grande dia após ele ver na tv uma reportagem dos beneficio do vinho em especial o Tannat, se convenceu a provar mas como remédio. Eu então preparei um jantar em família e comprei um belo vinho pra tomarmos. Foi um Carrau Amat Tannat 2004, publicado no livro dos 1001 vinhos pra beber antes de morrer e realmente foi um momento maravilhoso! Dai pra frente ele tomou todos os dias uma taça de Tannat.

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  20. Rodrigo, belas palavras, a família é o maior bem que possuímos neste plano, Seu Sitta, vosso querido pai, usou o adquirimos ao longo dos anos, sabedoria. Parabéns e obrigado por compartilhar essa linda história.

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